Depois de Gabriel
Enfim de volta, descubro a casa vazia. Uma desolação. Pergunto pelas razões deste silêncio. Sei da razão que mantém calado o militante Carlos Barata, já cansado do solilóquio. Sei também da minha, há tanto tempo sem tempo nem tino para retomar a vida que nunca há-de ser a mesma depois de Gabriel. Já me haviam prevenido que a vida se complica quando nos nasce um Gabriel. Uma e outra vez me preveniram, insistentemente, até me converterem num temente. Agora que vi a luz, compreendo o erro desse alerta. Na verdade, a vida fica mais simples. Depois de Gabriel, tudo se reduz a questões essenciais, dúvidas simples e alegrias modestas: benza-o Deus, que o menino arrotou; bendita sorte, que o menino adormeceu; alvísseras, que o menino cagou. É comovente a paz que se descobre num gás, a benção de uma hora de silêncio, a felicidade em cinquenta gramas de merda.