Ó vizinha dê cá música
De tão fielmente repetido, o gesto agarrou-se às manhãs de sábado com a força de um hábito antigo: cá por casa, o primeiro a saltar da cama vai até à porta da rua e abre-a o suficiente para deixar caber a mão e agarrar o saco pendurado no puxador do lado de fora. Lá dentro, um casqueiro alentejano bem cozido e ainda quente.
Pode acontecer que nesse dia vá trabalhar, que saia pouco depois apenas para comprar jornais ou partir ao encontro dos prezados companheiros para uma vez mais nos fazermos à estrada. Pode acontecer que simplesmente volte para dentro e me aplique a mandriar com o afinco de um atleta de alta competição. Podem acontecer muitas coisas na alvorada de um sábado, mas há duas que sempre se repetiram religiosamente, permitindo ao meu espírito amanhecer com a paz de uma certeza cavaquista: o meu pai deposita na minha porta um dos três pães da Vidigueira comprados trinta segundos depois do senhor Chico abrir as portas do minimercado; e a minha estimada vizinha de baixo dedica-se às lides da casa na companhia da sua amiga Celine Dion, frustrando a minha pretensão de prolongar o sono.
Até que, abrupta e sem aviso, a mudança chegou. É sabado. Salto da cama, arrasto uns passos descalços até à porta da rua, jogo a mão e pesco o saco. Lá dentro, o quilo prometido. Mas eis então que sou sacudido pela inesperada infidelidade da minha estimada vizinha: lá em baixo, uma voz masculina inunda hoje os metros cúbicos que antes eram coutada da estridente canadiana. Detenho-me em silêncio enquanto me esforço por reconstituir as feições dessa presença grave e familiar... mas que raio faz o Duarte Macias no meu prédio?!
Há umas semanas, toda a minha vizinhança descobriu os sons de Terra de Abrigo e o condomínio nunca mais foi o mesmo. Ao sábado, abro a porta de mansinho para apanhar o pão da Vidigueira e logo uma horda de alentejanos me invade a casa. E já cheguei a mandar-me calar a mim mesmo para conseguir dormir mais um pouco.
Pode acontecer que nesse dia vá trabalhar, que saia pouco depois apenas para comprar jornais ou partir ao encontro dos prezados companheiros para uma vez mais nos fazermos à estrada. Pode acontecer que simplesmente volte para dentro e me aplique a mandriar com o afinco de um atleta de alta competição. Podem acontecer muitas coisas na alvorada de um sábado, mas há duas que sempre se repetiram religiosamente, permitindo ao meu espírito amanhecer com a paz de uma certeza cavaquista: o meu pai deposita na minha porta um dos três pães da Vidigueira comprados trinta segundos depois do senhor Chico abrir as portas do minimercado; e a minha estimada vizinha de baixo dedica-se às lides da casa na companhia da sua amiga Celine Dion, frustrando a minha pretensão de prolongar o sono.
Até que, abrupta e sem aviso, a mudança chegou. É sabado. Salto da cama, arrasto uns passos descalços até à porta da rua, jogo a mão e pesco o saco. Lá dentro, o quilo prometido. Mas eis então que sou sacudido pela inesperada infidelidade da minha estimada vizinha: lá em baixo, uma voz masculina inunda hoje os metros cúbicos que antes eram coutada da estridente canadiana. Detenho-me em silêncio enquanto me esforço por reconstituir as feições dessa presença grave e familiar... mas que raio faz o Duarte Macias no meu prédio?!
Há umas semanas, toda a minha vizinhança descobriu os sons de Terra de Abrigo e o condomínio nunca mais foi o mesmo. Ao sábado, abro a porta de mansinho para apanhar o pão da Vidigueira e logo uma horda de alentejanos me invade a casa. E já cheguei a mandar-me calar a mim mesmo para conseguir dormir mais um pouco.
1 Comments:
Ia agora preparar-me para a estreia do cobertor outonal na minha caminha quando me chamaram a atenção para esta casqueiral e alentejana prosa.
Vou-me deitar mais bem disposto.
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