2.10.05

Bravo

Um concerto que reúne públicos da clássica e do fado, congrega inevitavelmente duas espécies de ouvidos: os de tísico, que escutam pormenores fora de alcance do comum dos mortais – “foi bom, mas houve para ali umas pequenas brigas nos segundos violinos” –, e os especialistas da alma, que conseguem perscrutar aquelas cambiantes que distinguem a verdade canónica das meras aproximações – “canta muito bem, a rapariga, mas aquilo às vezes não é bem fado”. Na ressaca da noite de sábado, quando a maioria partilhava cigarros e entusiasmos no átrio do Grande Auditório do CCB, apetecia gritar aos ouvidos dessa chata minoria que não, não há mas nem meio mas: o espectáculo que Kátia Guerreiro e o maestro Vasco Pearce de Azevedo, à frente da Orquestra Metropolitana de Lisboa (OML), ali acabavam de oferecer, alcançou uma felicidade sem reservas e roçou a perfeição.

No dia mundial da música escutou-se a Abertura Sinfónica nº3 de Joly Braga Santos e Suite Alentejana de Freitas Branco a abrir, respectivamente, a primeira e segunda parte. Seguiram-se-lhes dois sets de três fados apenas com a guitarra portuguesa de Paulo Valentim, a clássica de João Mário Veiga e o contrabaixo de Rodrigo Serrão. A terminar a primeira metade e a finalizar o espectáculo, o melhor da noite: toda esta gente em palco para interpretar a inteligência que Sérgio Azevedo e Vasco Pearce de Azevedo derramaram em orquestrações sobre um punhado de fados tradicionais e outros do repertório de Kátia Desacertos? Alguns, mínimos, perdidos no meio de momentos superlativos como Os Meus Versos, Rosa Vermelha, Perdigão ou Amor de Mel, Amor de Fel. E Kátia, brilhante e comovente, a cantar com uma segurança irrepreensível. No final, dois encores forçados por um entusiasmo compreensível e a certeza da urgência de registar este encontro em disco. *


foto: José Míguel Oliveira

Para ilustração, aqui fica a imagem do primeiro encontro entre o Vasco e a Kátia no palco do CCB. Foi a 24 de Janeiro de 2004 e nós estávamos lá.

* texto publicado em simultâneo no DN (não digam a ninguém)

2 Comments:

Blogger cbarata said...

Estimado companheiro: Obrigado por teres publicado este "bost" que nos prova a justeza da linha da Ronda ao escolher os "partners" da aventura alentejana. Obrigado, ainda, por nos poupares a compra do exemplar do exemplar dn

segunda-feira, outubro 03, 2005 10:31:00 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Caro sr. Oliveira,

Ao pesquisar na net deparei-me com este seu texto sobre o concerto da OML com Katia Guerreiro. Porém, ao pesquisar no DN não encontrei o texto que, assegura, foi lá publicado. Tratar-se-á de uma brincadeira, ou efectivamente o seu texto foi publicado no DN? Se sim, gostaria de o saber, se possível.


Atentamente,

Sérgio Azevedo

P.S. - o meu e-mail é: sergio.aze@sapo.pt

quinta-feira, outubro 20, 2005 4:32:00 da manhã  

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