19.9.05

Sideways




2510 quilómetros depois, o regresso a casa. Engraçado como por vezes me custa mais quando regresso que quando parto. Foi o caso. A parte do parto foi sem dor. E daí por diante tudo correu muito bem. Dez dias na estrada sem destino certo. Daqui para Braga, daí para Santiago (companheiros: 0 16 continua vivo). Daí para Nóia (e eu tenho uma paranóia, como sabeis, pelas terras galegas), de Nóia para Muros. Depois Estorde, depois Finisterra, depois Caión, depois Pontdeume, sempre a subir até à ponta da península para conhecer Ferrol, a terra do velho caudillo Franco. Vinho, pulpo, chipirones, mais vinho, gambas à la plancha, tábua de jamon, tábua de quejos, tábua de tudo com muito pão e por favor não se esqueça do vinho. Ribera, tinto, maduro, criança, 16 graus. E de postre? Carajillo, pois.

Seria o paraíso na Terra, não fosse esta terra o penico de Nosso Senhor. Começámos com chuva em Santiago. Até aí nada de novo. Não existe Santiago sem chuva. Fomos depois sempre para norte, correndo à frente das águas. Quando molhámos os pezinhos no Cantábrico e não restava mais para onde fugir, fintámos as nuvens com um inesperado e virtuoso drible, invertendo a marcha para paragens meridionais. E aí estamos nós em Sanxenxo, a banhos numa praia virada a sul. Jantar em Portunovo, mesmo ali ao lado. Pulpo e mais pulpo e mais gambas e mais vinho e o raio que parta esta gente que me há-de matar de gula e amores pelos encantos da sua mesa fraterna. E mais chuva.

Estamos em O Groove, capital mundial do marisco e da azia (é expressamente proíbida a entrada a forasteiros que não venham munidos de antiácidos). Um almoço frugal: venha pulpo, venha empanada de bacalao. E vinho, claro. Alvarinho das rias baixas. Para finalizar, bavaroise de Compensan.

Imagens sem som na TVE: primeiro da implosão das velhas carcaças da Torralta; agora da chuva impiedosa que se abate sobre o nordeste da península e das cheias em Navarra. Que estão os deuses a tentar dizer-nos? Que por estes dias Galiza, Astúrias e País Basco não são destino que se aconselhe a quem viaja de barraca às costas. Sem dúvida que sim. Que devemos rumar a Tróia ao encontro surpresa da família que ali se juntou para uma jantarada e ver a bola? Óbvio.

Seiscentos quilómetros depois, eis-nos a banhos de olhos postos na Arrábida. Uma mudança total de cenário. Gambas, farinheira com ovos, Pera Manca, pão, mais gambas, mais Pera Manca. Era branco, mas fez por merecer o nome. Que bom poder descansar daquela alarvidade galega, não é? No dia seguinte há feijoada e pão e vinho e o que mais houver. Fujamos amor, que eles nos querem matar pelo bucho! Rumo ao sul, uma vez mais, sem paragens até Odeceixe.

Dali até Aljezur é um saltinho. Fixem o nome: Pontapé. Mais uma bandeirola para espetar no mapa gastronómico. Bem no centro da vila, é só perguntar. Lulas à algarvia, e pão e vinho e pudim de batata doce e medronho e ai mãe que eu vou-me abaixo.

Seguem-se quatro dias de paraíso virado a sudoeste. Nós, quase ninguém e um tempo de entardeceres dourados. Os banhos no Algarve, na praia de Odeceixe, as refeições e as dormidas no Alentejo, ali mesmo em São Miguel, no melhor parque de campismo do País. Antes do fim, uma última paragem em Sesimbra. Noite no Hotel do Mar (cinco talones meus amigos, aproveitem). Gambas, ameijoas, vinho. Um modesto mas honrado BSE à temperatura certa.

E agora o regresso. A ressaca. Dois dias a abichornar pelos cantos da casa, na mais ronceira, despudorada e acéfala das perguiças. Um plácido e imenso domingo que fecha em grande com uma agradável surpresa: Sideways, filme que por alguma razão nos havia escapado desde 2004. Filme bonito e inteligente em que a viagem, a mesa e - mais que tudo - o vinho desempenham um papel central. E é esta a sugestão do dia.

5 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Bene venuto!! Esqueceste de dizer que o Mera Panca era branco e abusaste dos "us" em despudurado e sudueste. Apaga este comem-te que escusas de ficar com isto no resisto.

segunda-feira, setembro 19, 2005 11:25:00 da tarde  
Blogger Oliveira said...

Gralhas abatidas. Agradecido pelo alerta. São os custos de escrever à primeira, a mata-cavalos e sem sequer me dar ao trabalho de reler o texto na íntegra. Quanto ao comementário, fica muito bem onde está. Lá dizia um saudoso mestre: os advogados mandam erros para a prisão, os médicos despacham os seus num caixão. Os jornalistas, esses miseráveis, publicam-nos.

segunda-feira, setembro 19, 2005 11:38:00 da tarde  
Blogger Oliveira said...

Já agora: esse "resisto" é propositado? Não percebi.

segunda-feira, setembro 19, 2005 11:39:00 da tarde  
Blogger José Miguel Uribe Maldonado said...

hola

Me gusto mucho su blog, es muy interesante, esa forma que tiene su relato, a pesar de que me cuesta el portugués pude darme cuenta que es un excelente trabajo.

adios, revisa mi blog igual.

segunda-feira, setembro 19, 2005 11:44:00 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Diga-se, em desabono da mentira, que não esperaria o apagamento do meu comment. Mas quis dar-te essa prerrogativa e não fazer de mim um arquibufo pseudo-literato.
O companheiro peninsular "up-placed" escreve para um singular. Será que tem modelo e copypasta-o? Vou ver!

terça-feira, setembro 20, 2005 4:54:00 da tarde  

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